Coletivo Maria Maria luta por direitos das mulheres em Juiz de Fora

09 jul | 13 minutos de leitura

Mais que direitos! Um ato que deveria ser normal no dia a dia

 

Elas atuam em Juiz de Fora desde 2006. Elas são mulheres que lutam por mais direitos e igualdade. Elas querem conversar, atuar e mobilizar. Nós queremos!

O Coletivo Maria Maria – Mulheres em Moviemento foi fundado em 2006, em Juiz de Fora, por jovens da Universidade Federal de Juiz de Fora que observaram a necessidade de criar um espaço para o diálogo e atuação sobre questões referentes aos direitos das mulheres. O coletivo feminista se tornou, em 2007, um núcleo da Marcha das Mulheres em Juiz de Fora e hoje, conta com a incorporação de novas militantes, que desenvolvem atividades, intervenções, conversas e mobilizações na cidade. Elas buscam direitos e igualdade.

Na página do Facebook, mais de 2.400 curtidas, mulheres e homens, que acreditam que as coisas podem mudar. Os direitos das mulheres, de serem respeitadas, ganharem o salário igual dos homens e não receberem o julgamento da sociedade por diversas razões não deveriam ser direitos e sim deveres!

As lutas mais recentes do Coletivo Maria Maria em Juiz de Fora foi o assassinato de Marina Gonçalves Cunha, cujo assassino foi seu próprio marido; e o apoio a Eveline Barros, que denunciou o ex-namorado por agredi-la durante os três anos de relacionamento. 

 

#MarinaPresente

Marina Gonçalves Cunha foi assassinada pelo marido, Pedro, no dia 21 de maio. Após o assassinato, Pedro fingiu, com frieza e calma, durante três dias, ter sido abandonado pela esposa, juntamente aos três filhos do casal, que possuem idades entre 2 a 6 anos. A família de Marina desconfiou do desaparecimento, já que não recebiam notícia dela. Após dias de aflição, o corpo de Marina foi encontrado pela polícia, no dia 31 de maio, em um matagal no bairro Aeroporto, com sinais de violência e tentativa de ocultação de identidade. Pedro confessou o crime, sendo preso dia 7 de junho. Porém, no dia 14 do mesmo mês, o desembargador responsável pelo caso permitiu que Pedro respondesse pelo ato em liberdade, após deferir um pedido de habeas corpus. O desembargador explicou que não estava comprovado que o suspeito apresentava perigo para a sociedade.

O Coletivo Maria Maria, então, juntou suas forças e no dia 22 de junho uniu mulheres, homens, família e amigos de Marina, e em frente ao Banco do Brasil no Calçadão da Rua Halfeld, expressaram a raiva, angústia e o pensamento pela morte precoce de Marina. Não só pela morte de Marina, mas de Carlas, Anas, Luisas, Sandras, Barbaras. Contra a morte de diversas mulheres vítimas de feminicídio no Brasil.

Foto: Reprodução / Coletivo Maria Maria
Foto: Reprodução / Coletivo Maria Maria

Feminicído no Brasil

O feminicídio, segundo a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito sobre Violência contra a Mulher (Relatório Final, CPMI-VCM, 2013), “é a última instância de controle da mulher pelo homem: o controle da vida e da morte. Ele se expressa como afirmação irrestrita de posse, igualando a mulher a um objeto, quando cometido por parceiro ou ex-parceiro; como subjugação da intimidade e da sexualidade da mulher, por meio da violência sexual associada ao assassinato; como destruição da identidade da mulher, pela mutilação ou desfiguração de seu corpo; como aviltamento da dignidade da mulher, submetendo-a a tortura ou a tratamento cruel ou degradante“.

Segundo a Agência Patrícia Galvão e dados do Mapa da Violência 2015, o Brasil está entre os países com o maior índice de homicídios femininos, com uma taxa de 4,8 assassinatos em 100 mil mulheres. O Brasil ocupa a quinta posição em um ranking de 83 países.

Pesquisa de Percepção da sociedade sobre violência e assassinatos de mulheres (Data Popular/Instituto Patrícia Galvão, 2013)

#NãoSeCale – Eveline Barros

A final do Concurso de Mister e Miss Juiz de Fora foi realizado na cidade no dia 30 de Maio de 2018. O eleito Mister Juiz de Fora desse ano foi Felipe Guzzo e até o dia 4 de julho a coroa estava com ele. Hoje, Eveline Barros luta pela verdade e pela difusão de informações sobre agressão contra as mulheres.

Na tarde do último dia 4, Eveline publicou em seu Facebook que seu ex-namorado a agrediu durante os três anos de relacionamento. O ex-namorado é Felipe Guzzo, ganhador da coroa de Mister Juiz de Fora. Na publicação, Eveline detalha o que passou com o ex-namorado: agressões recorrentes que aconteceram durante a duração do relacionamento. Ela se questiona sobre o motivo de ter ficado em um relacionamento abusivo, física e emocionalmente. A resposta não vem de imediato e ela mesmo afirma que “acredita que só quem passa ou já passou por isso saberia responder“. Pena, impotência e vergonha são palavras que a jovem usou para tentar explicar os motivos que a impediram de tomar alguma atitude antes. Eveline finaliza a postagem aconselhando as mulheres que passam ou já passaram por essa situação: Não se cale! Denuncie! 

O Coletivo Mara Maria  – Mulheres em Movimento divulgou a informação na página do Facebook e, segundo as integrantes, em questão de minutos já tinha viralizado. Algumas horas depois veio a decisão dos organizadores do concurso de “depor” Felipe do título de Mister Juiz de Fora 2018. O Coletivo está em contato com a vítima e auxiliando no que ela precisar.

 

Violência contra a mulher no Brasil

Segundo dados do Balanço 2015 da Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, aponta que, dentre as denúncias de violências recebidas em 2015, em 3/4 dos casos, a violência é cometida diária ou semanalmente e que, dentre as mulheres atendidas em razão da violência, 3 em cada 10 sofriam violência por um período superior da 5 anos.

Com dados mais atualizados da 11ª Edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, temos números chocantes de violência contra a mulher:

1 estupro a cada 11 minutos;

1 mulher assassinada a cada 2 horas; 

503 mulheres vítimas de agressão a cada hora;

5 espancamentos a cada 2 minutos. 

Foto: Instituto Patrícia Galvão

Lembrando que esses números são de mulheres que denunciaram. O número de casos, vítimas e crimes é muito maior que isso. Em caso de violência contra a mulher: DISQUE 180 – Central de Atendimento à Mulher.

Coletivo Maria Maria e Marcha Mundial das Mulheres

A Marcha Mundial das Mulheres surgiu em 2000, com uma grande mobilização que reuniu mulheres do mundo todo em uma campanha contra a pobreza e a violência. As ações começaram em 8 de março, Dia Internacional da Mulher, e terminaram em 17 de outubro, organizadas a partir do chamado “2000 razões para marchar contra a pobreza e a violência sexista”.

Foto: Reprodução / Marcha Mundial das Mulheres.

O Coletivo Maria Maria – Mulheres em Movimento foi inspirado no trabalho da Marcha Mundial das Mulheres. O objetivo era tratar as discussões a respeito dos direitos das mulheres e todos os assuntos referentes à causa feminista. Inicialmente, os trabalhos do grupo eram ligados ao movimento estudantil e eram realizados grupos de estudos e atividades abertas dentro da UFJF. Em 2007, o Coletivo se integrou à Marcha Mundial das Mulheres, se tornando o núcleo da Marcha na cidade e promovendo, também, ações fora da Universidade.

Foto: Reprodução / Coletivo Maria Maria

Hoje, o Coletivo conta com cerca de 30 mulheres, as companheiras mais ativas no grupo. O número não é fixo, sempre tem novas integrantes chegando. Os homens não participam, eles podem ser companheiros e se solidarizarem, pois o ponto fundamental do grupo é a construção e auto-organização feminina.

Foto: Reprodução / Coletivo Maria Maria

Conversamos com o Coletivo Maria Maria para sabermos mais detalhes sobre o Grupo. Um deles é o campo de atuação do Coletivo, que se separa em: bem comum e serviços públicos; paz e desmilitarização; autonomia e economia; e violência contra as mulheres. Como explica as integrantes, cada um desses eixos se desdobra em reivindicações que apontam para a construção de outra realidade para a vida das mulheres. “Nosso movimento tem uma perspectiva anti-sistêmica, anti-capitalista, antissexista e anti-racista. Sob esse viés, atuamos, sobretudo, a partir das seguintes pautas: mercantilização dos corpos, sexualidade, aborto, violência e autonomia econômica“, explicam as integrantes.

Evento Batucada: busca democratizar a fala nas ruas e é um instrumento político de luta que expressa a ação feminista.

Eventos e reuniões

O Coletivo Maria Maria realiza diversas atividades, como oficinas, encontro de formação, intervenções e mobilizações em espaços públicos (essas são sempre divulgadas na página do Facebook). As integrantes também fazem acompanhamento de mulheres junto ao serviço público especializado de mulheres e vítimas de violência e possuem um projeto que debate o feminismo nas escolas. “Nossas reuniões organizativas ocorrem toda segunda quinta-feira feira do mês. Uma vez por mês também temos um grupo de estudos que debatemos artigos, livros referentes ao feminismo, e uma atividade mais descontraída (Café das Minas ou o Buteco das Minas). Buscamos, com essas duas últimas atividades, apresentar o nosso coletivo e propiciar um espaço onde nós mulheres possamos compartilhar nossas experiências“, completam as integrantes do Coletivo.

Evento: Café das Minas (Foto: Reprodução / Coletivo Maria Maria).

Medalha Rosa Cabinda – a criação

No dia 7 de março de 2018, véspera do Dia Internacional da Mulher, foi entregue na Câmara de Juiz de Fora a Medalha Rosa Cabinda. Ela homenageava mulheres da cidade que possuíam diversos motivos para serem reconhecidas. As integrantes do Coletivo contam que a ideia da Medalha surgiu nas reuniões do Oito de Março, onde outros coletivos também participam. Elas ficaram sabendo de uma história que estava circulando no Facebook.

Uma neta estava indignada que o avô receberia a Comenda Henrique Halfeld pela fama de sua padaria. No entanto, segundo a neta, por mais que o avô tivesse sempre ao lado de Dona Deolinda, foi ela, sua avó, a responsável pelo sucesso da padaria. Deolinda, com seus quitutes vindos de Portugal, era a essência do estabelecimento“, explicam as integrantes. A ideia foi levada para a reunião dos coletivos e aprovada por unanimidade. “O objetivo era homenagear apenas mulheres, tendo em vista que a Comenda Henrique Halfeld é oferecida, em sua maioria, aos homens da cidade, deixando de lado diversas mulheres que contribuíram e contribuem muito para a construção da Juiz de Fora que temos hoje“, completa o Coletivo.

O nome Rosa Cabinda surgiu numa dessas reuniões, em que uma de nós explicou que Rosa foi uma escrava de Henrique Halfeld que lutou toda a vida pela sua libertação. “A cerimônia, realizada na Câmara Municipal, foi maravilhosa! Homenageamos 25 mulheres de diversas áreas e idades! Um dia para ficar guardado na memória“, dizem as integrantes emocionadas.

Senhora Deolinda, inspiração para a Criação da Medalha, com sua medalha. (Foto: Padaria Linda / Reprodução).

Sobre denunciar a violência contra a mulher

As integrantes do Coletivo contam que sempre recebem mensagens e pedido de ajuda de mulheres em situação de violência. Elas contam que no primeiro momento, conversam com as vítimas para entenderem e ajudar. É importante destacar que o Coletivo não é um serviço especializado, e sim um movimento social. “Lutamos pelo fim da violência contra mulheres, por autonomia, por um novo sistema que mude a vida delas“, explica as integrantes.

A partir da conversa, encaminhamos a mulher para o serviço público que melhor vai atendê-la, como, por exemplo, a Casa da Mulher, a Defensoria Pública ou o Centro de Referência em Direitos Humanos“, completa o Coletivo. Elas também acompanham as vítimas quando necessário. “Denunciar é difícil e muitas vezes as mulheres não têm força para fazer. O nosso papel é conversar e fortalecer essas mulheres, para que juntas consigamos conquistar um mundo melhor“, reforçam as integrantes.

Integrantes do Coletivo (Foto: Reprodução / Coletivo Maria Maria)

Medo, vergonha e insegurança

Nossa sociedade julga, sim. Por medo, por vergonha, por insegurança e por diversos outros motivos, as mulheres que sofrem algum tipo de violência não denunciam o agressor. Ele pode ser seu esposo, o pai dos seus filhos, um namorado antigo. Pode ser da sua família. Esses motivos desencorajam a mulher que foi vítima de alguma violência. Somado a isso, vem a sociedade e julga a vítima. Falam que ela provocou, que estava na rua na hora errada, que não devia ter dado confiança para o fulano.

Achamos que a polícia e os hospitais precisam estar preparados para receber mulheres vítimas de violência; acreditamos que o descaso com elas, nesse caso, está relacionado ao machismo, que coloca a mulher como causadora da violência que sofre e que busca amenizar as agressões praticadas pelo homem.Tratam como problema comum entre casais. Assim, tentam justificar, muitas vezes, o mal atendimento por policiais. Enquanto isso a mulher vive aquela dor e não sabe nem o que fazer”, explica o Coletivo.

 

“Ter forças para denunciar já é difícil, imagine conseguir fazer isso e ao chegar na delegacia ser julgada e desacreditada por quem deveria te ajudar? Se, ainda sim, a mulher conseguir dar prosseguimento à denúncia, logo aparecem familiares para desanimá-las. São muitos obstáculos para as vítimas conseguirem justiça”, completam. 

Foto: Reprodução / Coletivo Maria Maria

Caso você queria conhecer mais sobre a causa, o Coletivo Maria Maria separou algumas dicas de filmes, autoras e diversas outras formas do público entender o ideal.

 

Mulheres inspiradoras:

Dandara;

Frida Kahlo;

Angela Davis;

Rosa Luxemburgo;

Simone de Beauvoir;

Audre Lorde;

Maria da Penha;

Elza soares;

Mães de Maio na Argentina;

Marielle Franco;

Conceição Evaristo;

Carolina Maria de Jesus;

Marsha Johnson.

 

Filmes:

O aborto dos Outros;

Somos Todas Clandestinas;

Formigueiro;

Todos os filmes de Agnès Varda;

Persépolis;

A força da mulher Quilombola;

She’s beautiful when she’s angry;

The punk singer;

As Sufragistas;

Que horas ela volta?;

Libertem Angela;

A cor Púrpura;

Desejo Proibido;

Terra Fria;

Histórias Cruzadas.

 

Autoras:

Monique WIttig;

Joan Scott;

Virginia Woolf;

Judith Buttler;

Simone de Beauvoir;

Sueli Carneiro;

Lélia González;

Beatriz Nascimento;

Ângela Davis.

 

Atrizes, cantoras, políticas, personalidades:

Elza Soares;

Elisa Lucinda;

Pitty;

Karol Conka;

Karina Buhr;

Djamila Ribeiro.

 

Sites:

Marcha Mundial das Mulheres

Sempreviva Organização Feminina

Coletivo Maria Maria (com novo site em breve)

 

Próximo evento do Coletivo Maria Maria:

Reunião na próxima quinta-feira, dia 12, às 18h30 no Sindicato dos Metalúrgicos (Rua Floriano, 72- Centro). Aberta a todas que se interessarem pelas lutas do coletivo.

Mais informações na página do Coletivo.

Foto: Reprodução / Coletivo Maria Maria

Em caso de violência contra mulher: DISQUE 180 – Central de Atendimento à Mulher.

 

 

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