Marighella: conheça a história e saiba detalhes do filme

21 jan | 8 minutos de leitura

Filme tem direção de Wagner Moura

O Festival de Berlim entra em sua 69ª edição e, em 2019 ele vai trazer um lançamento brasileiro que está dando o que falar.

Uma das novidades dessa edição, que vai ser realizada entre os dias 7 a 17 de fevereiro, é a estreia mundial do filme Marighella, que foi selecionado para a mostra principal da cerimônia. A produção, porém, não irá competir pelo Urso de Ouro, que é a premiação entregue aos vencedores da categoria de melhor filme.

Apesar de estrear mundialmente em fevereiro, a produção não tem data definida para chegar ao Brasil, mas especula-se que seja em abril. Marighella: filme estreia em Festival de Berlim

Marighella: conheça a história e saiba detalhes do filme

 

O filme Marighella

Marcando a estreia de Wagner Moura como diretor e Seu Jorge como papel principal, o filme, que foi produzido pela O2 filmes, conta a história do guerrilheiro, deputado e militante político brasileiro Carlos Marighella, que lutou contra a ditadura militar brasileira.

Além de Seu Jorge e Wagner Moura como destaques, o elenco do filme conta com nomes como Adriana Esteves, Bruno Gagliasso, Jorge Paz, Luiz Carlos Vasconcelos e Humberto Carrão.

Inspirado no livro Marighella – O Guerrilheiro que Incendiou o Mundo, do jornalista Mário Magalhães, lançado em 2012, o filme está orçado em 10 milhões de reais. Em desenvolvimento desde 2013, mais de 800 atores, incluindo o músico Mano Brown, líder do Racionais MC’s, fizeram testes para o papel principal.

Para quem pensa que as gravações foram fáceis, o diretor Wagner Moura disse em entrevista à Folha de S. Paulo, que logo no início das filmagens, se deparou com ameaças de direitistas nas redes sociais, que prometiam invadir o set de gravações. Wagner ainda diz que a ideia de invasão não aconteceu devido ao apoio de 15 jovens antifascistas, que protegeram o set.

Segundo declarações de Wagner Moura, ele acredita que o filme será bem debatido. “Estou preparado para ser odiado pela direita e criticado pela esquerda”, contou.

 

Quem foi Marighella?

Carlos Marighella foi um político, guerrilheiro e poeta, nascido em Salvador, Bahia, em 1911. Ele chegou a ser considerado o grande inimigo da ditadura.

Passando pelos regimes do Estado Novo (1937-1945), de Getúlio Vargas, e a ditadura militar iniciada em 1964, Marighella foi um dos principais organizadores da resistência contra o regime militar. 

Em 1932 foi preso pela primeira vez, após escrever um poema com críticas ao interventor Juracy Magalhães. Já em 1934, ele abandonou o curso de Engenharia Civil da Escola Politécnica da Bahia para ingressar no Partido Comunista Brasileiro (PCB). Mudou-se para o Rio de Janeiro e se tornou militante profissional do partido, trabalhando na reorganização do PCB.

Em 1946 Marighella foi eleito deputado federal constituinte pelo PCB baiano, mas após dois anos perdeu o mandato. Após isso, ocupou diversos cargos em direções partidárias, a maioria como clandestino. Entre 1953 e 1954, convidado pelo Comitê Central, Carlos foi para a China, conhecer de perto a Revolução Chinesa. Já em 1964, após o golpe militar, foi baleado dentro de um cinema e preso por agentes do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS).

Após a saída da prisão, Carlos decidiu se engajar na luta armada contra a ditadura, e com isso escreveu o livro “A Crise Brasileira”. Foi expulso do PCB e no ano seguinte fundou o grupo armado Ação Libertadora Nacional( ALN). Participaram de diversos assaltos a banco e sequestraram o embaixador norte-americano Charles Elbrick, em 1969, numa ação com o Movimento Revolucionário 8 de Outubro. Depois, o embaixador foi trocado por 15 presos políticos.

Com o agravamento do regime militar, os órgãos de repressão focaram na captura de Marighella. Na noite 04 de novembro de 1969, ele sofreu uma emboscada na alameda Casa Branca, em São Paulo. Carlos foi morto a tiros por agentes do DOPS, em uma ação que tinha como responsável o delegado Sérgio Paranhos Fleury.

Mesmo sem Carlos Marighella, a ALN continuou. Joaquim Câmara Ferreira assumiu o controle do grupo, mas um ano após também foi morto Sérgio Paranhos Fleury. Em 1972, outros militantes que possuíam envolvimento com Marighella, faziam panfletagem contra a ditadura e também foram assassinados ou considerados desaparecidos. Até 1974 foram registrados movimentos da ALN no Brasil.

Carlos Eugênio Sarmento da Paz, o último líder da ALN, sobreviveu devido ao exílio na França.

 

O que Marighella escreveu

Alguns textos políticos que Carlos Marighella escreveu, ganharam primeiro uma edição em língua estrangeira, devido à censura do regime militar no país. O texto “Pela libertação do Brasil”, ganhou uma versão na França, financiada por grupos marxistas, em 1970.

Marighella é muito conhecido pela obra “O Minimanual do Guerrilheiro Urbano”, foi escrito em 1969, para servir de orientação aos movimentos revolucionários. No material, há detalhes de guerrilha urbana a serem empregadas nas lutas contra governos ditatoriais.

 

Anistia póstuma de Marighella

O Ministério da Justiça, em 1996, reconheceu a responsabilidade do Estado na morte de Carlos Marighella. Em 2008 foi decidido que sua companheira, Clara Charf deveria receber pensão vitalícia do governo brasileiro. A família do guerrilheiro, porém, não solicitou reparação econômica, mas sim o reconhecimento da perseguição ao militante.

Já em 2012, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, oficializou a anistia post mortem de Marighella. Em 2013, a Comissão da Verdade realizou um ato em homenagem ao aniversário de 44 anos da morte do guerrilheiro.

 

Documentário, livro e filme

Em comemoração ao centenário de nascimento de Carlos Marighella, a sobrinha do guerrilheiro, Isa Grinspum Ferraz, socióloga e documentarista, construiu um material sobre a trajetória do tio.

Com 100 minutos e 32 depoimentos, entre eles o intelectual Antonio Candido, com participações de Lázaro Ramos, como narrador, e do rapper Mano Brown, a proposta de Isa é mostrar outras faces do guerrilheiro, que ela conheceu nas reuniões de família.

Já Mário Magalhães usou as palavras escritas para contar sobre a vida do guerrilheiro brasileiro “temido” por Cecil Borer, diretor do Dops do Rio. A obra “Marighella – o Guerrilheiro Que Incendiou o Mundo”, foi lançada em 2012, após nove anos de apuração.

O livro conta a biografia de Marighella, sendo caracterizado pelo jornalista como guerrilheiro intrépido, bem-humorado e sedutor. O autor do livro foi repórter especial e ombudsman da Folha de S. Paulo. Junto ao personagem principal, estão as figuras de Fidel Castro, Getúlio Vargas, Carlos Lamarca, João Goulart, Che Guevara, Luiz Carlos Prestes, Carlos Lacerda e Olga Benario.

Já em 2019, Wagner Moura apresenta um Carlos Marighella interpretado por Seu Jorge, pretendendo desconstruir diversas narrativas que foram apresentadas por décadas no Brasil.

Em entrevista a Pedro Bial, no programa Conversa com Bial, Wagner conta que a população brasileira gosta de filmes de ação, porém o que mais se produz no país são filmes de comédia. A proposta do ator e estreante na direção é fazer um filme de ação sobre a vida de Marighella.

 

Brasil no Festival de Berlim

Para quem acompanha o calendário de premiações, deve lembrar que o Brasil já passou pelos corredores e telas do Festival de Berlim outras vezes.

Um dos grandes destaques vai para atriz Ana Beatriz Nogueira, com o filme Vera, ganhadora do prêmio de melhor atriz, em 1987.

Outro grande destaque vai para o filme “Central do Brasil” e Fernanda Montenegro, em 1998. O filme conquistou o troféu Urso de Ouro e Fernanda Montenegro o troféu do Urso de Prata, de melhor atriz.

 

Marighella no Festival de Berlim*

*atualizado dia 19 de fevereiro de 2019

Após a estreia do filme no Festival de Berlim, o que se viu e comprovou foi o cenário que o Brasil está enfrentando, extremamente polarizado entre esquerda e direita.

Durante o tapete vermelho, Wagner Moura levantou uma placa com o nome da deputada Marielle Franco, assassinada em 2018 e que ainda não possui solução.

Na primeira exibição do filme em Berlim, o ex-deputado federal Jean Willys estava na plateia em segundo informações dos bastidores, foi bem recebido por Wagner Moura.

Já o filme, foi relativamente bem recebido, arrancando aplausos de parte da plateia. Mas a polêmica ficou por conta do que aconteceu na coletiva de imprensa, após a exibição do filme.

Wagner Moura disse que o filme é maior que o atual presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, mas que não é uma resposta a ele, embora seja um filme com o viés político ao contrário. Ele explicou que a produção é, provavelmente, o primeiro filme da resistência que está acontecendo no Brasil. O diretor comparou a resistência ocorrida em 1964, com a que os cidadão estão tendo, principalmente as comunidades LGBT, negra e indígena.

O ator Bruno Gagliasso, que vive um policial no filme, disse que teve dificuldades para construir seu personagem, pois precisava bater e odiar Marighella. Para ele, a dificuldade foi por causa de sua filha adotiva Titi, que é negra, sendo que eles enfrentaram situações de ódios racial no Brasil. Bruno encerra, emocionado, dizendo que conseguiu fazer o filme e as cenas, pois enxergou a importância do longa para sua filha no futuro.

 

Discurso de ódio na internet

Após a coletiva, diversas pessoas publicaram comentários de ódio nas redes sociais dos atores e dos canais do Festival de Berlim. A maioria dos comentários eram em português e, de tão pesados, tiveram que ser bloqueados e tirados do ar pelo site.

O site de avaliação crítica de filmes feitos pelos próprios usuários, o IMBD, teve que apagar as avaliações ao filme, após a nota chegar em 2,8. Ao todo, foram mais de 30 mil votos negativos e mais de mil comentários de ódio. Vale lembrar que o filme teve apenas quatro exibições no Festival de Berlim, e que juntando toda essa plateia, não daria 30 mil pessoas.

Wagner confirmou o que esperava: “Lançar ‘Marighella’ no Brasil não vai ser nada fácil”.

 

 

[vejatambem]